Maia: metáfora e catarse eletrônicas

Fausto Antônio de Azevedo

Alguém já disse que a vida é um jogo (e que é também uma realidade alucinada ou um eterno desejo…); então, por que não – e cada vez mais – os jogos eletrônicos, à parte suas especificidades tecnológicas e técnicas, não partirem de fundamentos de críticas psicológicas e sociais?

Aí está um filão em pleno crescimento (vejam-se, dentre outros: https://www.theverge.com/2019/7/5/20681134/sea-of-solitude-review-ps4-xbox-one-pc / trauma e depressão; https://cincotons.com.br/colunas/gris-jogo-analise/amp/ / luto; https://venturebeat.com/2019/10/26/how-hellblade-senuas-sacrifice-changed-lives-with-its-thoughtful-portrayal-of-mental-illness/ / saúde mental).

Maia: “Unhappily Ever After” é a narrativa de uma jovem mulher presa num relacionamento abusivo (esses relacionamentos podem ir, num grande leque, desde a explícita forma de agressões físicas até à sutil inteligência de pessoas perversas que praticam o “gaslighting”). Influenciada pelo seu companheiro, “Maia vive uma realidade perigosa ao compreender o mundo de uma forma distorcida. Não se achando capaz de sobreviver ao caos criado por seu parceiro, ela utiliza metáforas imaginativas para enfrentar obstáculos e cumprir as suas demandas”. E tais metáforas podem funcionar parcial e/ou temporariamente como escudo protetor, assim como a formação de um sintoma nas neuroses, mas há sempre o risco de rompimento do dique e de alagamento de todo o psiquismo… A não reação à altura contra um abuso pode criar – e cria – traumas que cobrarão seu preço em outras áreas da vida, como a pessoal, a profissional, a emocional, e a saúde (por exemplo, somatizações). Numa relação abusiva, sempre estão agindo outras dinâmicas ocultas, a exemplo de jogos de poder, violência, insegurança e, o que é bem importante, uma repetição de padrões presentes em nosso próprio modelo familiar, os quais no mais das vezes desconhecemos e atuam subrepticiamente.

Pensando nisso, Letícia Pereira de Souza e Celso Graeser Júnior desenvolveram o “Maia”, um jogo que tanto diverte os aficionados quanto, agudamente, conclama à reflexão e à atitude. Numa atmosfera por óbvio lúdica, mas também aconchegante e serena, Maia caminha praticando suas metáforas e fazendo sua catarse, ao som de uma trilha, de autoria de André Rebouças, que muito se encaixou e sublinhou todo o clima da obra.

Tecnicamente, trata-se de um 2D Puzzle platformer.

Ver o trailer em: https://www.youtube.com/watch?v=mlaEsrdagpM.

Versão demo para baixar em: https://perpetuosgames.itch.io/maia-unhappily-ever-after

Youtube:https://www.youtube.com/watch?v=mlaEsrdagpM&ab_channel=Perp%C3%A9tuosGames

Maia, que foi desenvolvido pelo Studio Perpétuos Games por alunos do Instituto Politécnico de Leiria, durante o primeiro ano do curso de Games and Multimedia, está selecionado entre os dez finalistas do VI Prémios PlayStation. Ver em: https://www.youtube.com/watch?v=RTRAW6hbTbE&ab_channel=PlayStationPortugal).