A era dos aplicativos

Aplicar, do latim applicare, composto por ad (em direção a, para) e plicare (fazer dobras, no sentido de conectar). Por assimilação, o prefixo ad se altera para ap quando está antes de “p”. Do verbo plicare derivam outras palavras, como implicar, explicar, complicar. Plicare tem em sua origem uma raiz indoeuropéia, plek (dobrar, trançar), que no grego gerará diploos, dobrado em dois, que nos vai dar, por exemplo, diploma. Aplicar tem a ver com pôr (algo) sobre, em cima de, sobrepor, pôr em execução, em prática, empregar, medicar, injetar, investir, empenhar-se. Pôr algo em prática para auferir algum ganho ou benefício.

Aplicativo (do latim apllicativu; tivo é um sufixo formador de adjetivos a partir de verbos, vem de outro sufixo, ivo) é aquilo que se pode aplicar, que se faz aplicável, ou melhor, é aquilo (dispositivo ou regra) que torna algo aplicável num dado propósito ou utilidade.

Na área de informática exemplificamos com o fato de que um software aplicativo é aquele planejado para desempenhar tarefas práticas. Isto o diferencia de outros tipos de programas, como os sistemas operativos, linguagens de programação e os utilitários. Um software aplicativo realiza tarefas ordenadamente para recolher dados e organizar informações, isto é, processa os dados. Processadores de texto, planilhas de cálculo e bases de dados são softwares aplicativos.

Aplicativos móveis são softwares instalados em dispositivos (plataformas) móveis (Smartphones, PDA, celulares) e executam um serviço ou geram resultado de interesse do usuário. Aplicativos de celular são softwares que rodam em dispositivos móveis como celulares, tablets, reprodutores multimídia, leitores de livro (ebooks), etc.

Hoje, existe uma infinidade de tipos de aplicativos, incluindo todo o largo leque dos móveis, com as mais variadas funções, finalidades e para todos os tipos de interesses. Há aplicativos para oferta de serviços, informações, comunicação e entretenimento. Dentro de cada classe, as possibilidades são inúmeras. Um aplicativo de serviço pode fornecer dados sobre a previsão do tempo; um de informação pode oferecer guias de lojas e telefones úteis; um de comunicação pode conectar pessoas; um de entretenimento pode garantir diversão a qualquer hora, etc.

A quantidade é impactante: mais de 5 milhões de aplicativos no mundo1. É comum que as pessoas usuárias de telefone celular (o encantador “telemóvel’ de Portugal…) tenham dezenas instalados em seu aparelho, embora no dia a dia utilizem bem menos. Acredita-se que usuários que baixam APP com muita frequência não transpõem os 3 mil baixados.

[1] Ver Luis Carlos Sá. Existem mais de 5 milhões de aplicativos no mundo. (3/7/17) Disponível em: https://www.infotecblog.com.br/2017/07/03/existem-mais-de-5-milhoes-de-aplicativos-no-mundo/

Google e Apple respondem por 5 milhões de aplicativos para celular: 2,8 milhões disponíveis para o sistema operacional da Google e 2,2 milhões lançados para os celulares da Apple (deve-se fazer uma breve ressalva, porque esses números incluem os repetidos, disponíveis para Android e iOS, e os que não ganham real utilidade prática).

Apesar de números tão avassaladores, que fazem pensar que tudo que seria possível inventar já o foi, os desenvolvedores têm se superado a cada ano e o mercado de APP não evidencia, pelo menos até aqui, qualquer enfraquecimento.

A diversidade desses aplicativos é extremamente elástica, podem ser agrupados por assunto, temática ou por empresa, etc. Por exemplo, aplicativos para finanças pessoais (Finanças Pessoais; GuiaBolso; Minhas Economias; Organizze; QuickBooks; ZeroPaper); aplicativos para economizar em ligações telefônicas (Consulta Número; Mobobox; Whoscall); aplicativos para aprender idiomas (Babbel; Busuu; Duoling; HiNative; LinguaLeo)… Não querendo cansar o leitor, citamos outras duas categorias curiosas:

Inquestionável dizer que esses aplicativos encontraram seu boom com o advento de equipamentos móveis, como os tablets e os celulares (sobretudo com a chegada e a modernização dos smartphones, início dos 2000).

Entre smartphones, computadores, notebooks e tablets, o Brasil tem 2 dispositivos por habitante. Em 2019, teremos 420 milhões de aparelhos digitais ativos, revela a 30ª Pesquisa Anual de Administração e Uso de Tecnologia da Informação nas Empresas, feita pela Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.2 Desde 2018, já temos mais de um smartphone por habitante, todavia, o mercado de aparelhos digitais pode estar chegando à saturação, porque os brasileiros já têm seus smartphones e computadores.

[2] Brasil tem 230 milhões de smartphones em uso. (26/4/2019). Disponível em: https://epocanegocios.globo.com/Tecnologia/noticia/2019/04/brasil-tem-230-milhoes-de-smartphones-em-uso.html

Segundo a App Annie (https://www.appannie.com/en/), os brasileiros estão entre os que mais utilizam celular (superamos os Estados Unidos) e possuem, em média, 80 aplicativos em seus aparelhos, porém usam apenas 40.3

[3] App Annie. Spotlight on Consumer App Usage. (2017) Pdf disponível em:

http://files.appannie.com.s3.amazonaws.com/reports/1705_Report_Consumer_App_Usage_EN.pdf

Brasileiros, a cada dia, usam 11 aplicativos em diferentes categorias, gastando, como média, 180 minutos/dia neles. Mais de 25% deste tempo são gastos somente com Facebook e Whatsapp. Outros tipos de aplicativos mais usados são:

1. Redes sociais – os dois antes citados mais Instagran e Youtube;

2. Jogos – a variedade disponível é muito grande; o Candy Crush é um dos sucessos; além de My Talking Tom, Pou, Subway Surfers;

3. APP de relacionamentos – como Badoo, Tinder;

4. APP de mapas e GPS – Google Maps, Waze, e mesmo o Uber;

5. Internet banking.

A despeito da questão de versão e atualização do aparelho celular em uso, os aplicativos proporcionam aos usuários; (i) otimização da navegação e agilidade das ações; (ii) menor custo de acesso, pois devido à interface adaptada, o tráfego de dados necessários para a navegação é menor em relação ao uso de navegadores convencionais; (iii) melhor aproveitamento possível do aparelho graças à exploração de recursos como GPS, câmera fotográfica e Bluetooth; (iv) todo esse leque de possibilidades mesmo sem internet.

Uma breve linha do tempo4 para o surgimento e uso de aplicativos móveis nos dá bem a idéia da dimensão explosiva com que caíram no gosto e no hábito das pessoas, facultando-nos, o que fizemos no título, pensar numa Era dos aplicativos como sendo o tempo em que uma nova e diferente dinâmica social foi produzida a partir de um fato tecnológico.

[4] Portal iG. Era dos aplicativos? Veja como esses softwares tornaram-se indispensáveis. (2019) Disponível em: https://www.ig.com.br/tudo-sobre/aplicativo/

1993: IBM inicia venda do celular Simon, inaugurando o caminho para o desenvolvimento dos smartphones modernos, por meio da adição de tela sensível ao toque. O modelo incluía calendário, relógio mundial, agenda de contatos, calculadora, bloco de notas, e-mail e games.

1997: Ericson usa a expressão smartphone para referir-se ao celular GS 88. No mesmo ano são lançados os modelos Nokia 900 e Nokia 9500, com funções de smartphone.

2002: RIM lança seus primeiros dispositivos BlackBerry com funcionalidade de telefone integrada. O produto tornou-se o primeiro smartphone vendido em massa no mercado capaz de enviar e receber e-mails para outro dispositivo com conexão sem fio.

2005: Google compra a plataforma Android, a primeira para dispositivos móveis baseada em Linux.

2007: Apple lança seu primeiro iPhone, com conjunto padrão de aplicativos já instalado, incluindo: mapas, fotos, textos e informações sobre a previsão do tempo.

2008: em julho, a Apple lança a App Store e o iPhone 3G. Três meses depois, o Google lança o Android Marketing, que posteriormente será conhecido como Google Play, e o HTC lança o HTC Dream, primeiro smartphone comercialmente viável a rodar o Android.

2009: o número de downloads de aplicativos realizados a partir da App Store ultrapassa a marca de 1 bilhão.

2010: abril, a Apple lança seu primeiro iPad, e, em agosto, o Google Play, ainda chamado de Android Market, ultrapassa 1 bilhão de downloads. Em setembro, a Sansung lança o Galaxy, o primeiro tablet com sistema operacional Android nos Estados Unidos.

2011: em janeiro, a App Store ultrapassa 10 bilhões de downloads; em março é lançado o iPad 2. Sete meses mais tarde vem o iPhone 4S. Em dezembro, o número de downloads realizados no Android Market ultrapassa 10 bilhões. O Beautiful Widgets torna-se o primeiro aplicativo pago do sistema operacional Android a atingir 10 bilhões de downloads.

2012: em março, a Apple divulga a terceira geração do iPad (“O Novo Ipad”), o Android Market passa a se chamar Google Play, e o número de donwloads de aplicativos realizados pela App Store passa de 25 bilhões. Os smartphones representam metade do mercado de celulares dos Estados Unidos. Em abril, 50 dias depois de seu lançamento, o aplicativo Draw Something atinge 50 milhões de downloads. O Instagram ultrapassa os 502 milhões de downloads (em janeiro, eram apenas 12 milhões). Em maio, o número de downloads de aplicativos do Google Play passa os 15 bilhões; a Microsoft lança o Windows 8 e aplica o estilo dos aplicativos de smartphone aos computadores. O game Angrybirds ultrapassa 1 bilhão de downloads no mundo.

2016: o WhatsApp supera a marca de mais de um bilhão de usuários ativos no mundo. Um levantamento do Sensor Tower indica que a App Store fechou o ano de 2015 com cerca de 1,75 milhão de aplicativos disponíveis para os usuários.

Para desenvolver um APP

A quantidade de pessoas envolvidas ou desejosas de criar aplicativos tem crescido em escala notável. Algumas realmente obtêm sucesso, outras encontram dificuldades, mormente por questões de planejamento e método.

Para os iniciantes, talvez seja sempre interessante compartilhar a idéia com outra pessoa, mais experiente ou não, para que ambos possam analisar sua viabilidade e formas de aperfeiçoamento. A atitude de estar aberto a críticas e sugestões é muito valiosa nesta fase.

É preciso desde cedo pensar e escrever o modelo de negócios do aplicativo e quais serão as fontes de custeio para sua criação. Otimizar o modelo de negócios deve ser uma prática constante, orientando-o e adaptando-o às tendências e desejos do mercado.

É importante que o aplicativo a ser desenvolvido tenha potencial de uso em mais de uma oportunidade, a fim de gerar engajamento e fidelização de seus usuários.

No mercado e na internet existe uma plêiade de programas e plataformas especializados para o desenvolvimento de aplicativos, como: App2Sales; Appery.io; AppMachine; AppMakr; Appy Pie; BiznessApps; GameSalad; Good Barber; Mobile Roadie; Opus; ShoutEm; TheAppBuilder.5

[5] Luciano Larrossa. 11 excelentes plataformas para criar aplicativos móveis. Disponível em: https://www.apptuts.com.br/tutorial/android/plataformas-para-criar-aplicativos-moveis/

A Era dos Aplicativos

Vivemos uma epidemia de eras. Eras & sociedades. Conforme a filosofia e a ideologia dos autores e escolas, é criada uma denominação para essa era ou sociedade a que se referem. Era da informação; Era 4G e IoT; Era da passividade, Era genômica, Era da pós-verdade, ad infinitum.

Nossa sociedade pós-moderna é caracterizada pela cultura do narcisismo (Lash) e como sendo uma sociedade do espetáculo (Debord), uma sociedade de risco (Beck), uma sociedade excitada (Turcke). E mesmo civilização da fumaça, segundo nosso grande músico Antonio Carlos Jobim.6 Em tal sociedade o poder, independentemente da inclinação ideológica, instala o espetáculo para se perpetuar em sua situação de privilégio – e um vigoroso espetáculo é o permanentemente proporcionado pelos avanços tecnológicos em todas as áreas, sobretudo nas TIC. Outra roupagem desse fenômeno é exatamente a espetacularização do eu, do“si”, pela tóxica exposição na mídia e nas redes sociais a que as pessoas se submetem. Dificultando o acesso à realidade, fomentando sistematicamente ilusões, negando a castração simbólica, a sociedade do espetáculo dá margem ao que muitos chamam de novas formas de subjetivação, como os novos transtornos de caráter, os transtornos de ordem narcísica, as personalidades borderlines, e os transtornos alimentares, as depressões e pânico.

[6]. AZEVEDO, Fausto A. de. 80 anos depois: um mal-estar ambiental. RevInter Revista Intertox de Toxicologia, Risco Ambiental e Sociedade, v. 4, n. 1, p. 96-137, fev. 2011.

Pdf disponível em http://www.revistarevinter.com.br/minhas-revistas/2011/v-4-n-1-2011-volume-4-numero-1-fevereiro-de-2011-sao-paulo/154-80-anos-depois-um-mal-estar-ambiental/file

Mundo Psi & (X) universo APP

O mundo das atividades Psi (Psiquiatria, Psicologia, Psicanálise) não poderia quedar blindado do avanço das TIC e dos APP. Assim, de acordo com Barbosa e cols.7:

[7] BARBOSA, A.M. et alii. The new communication technologies: issues for psychoanalytical practice. Cad. Psicanál.-CPRJ, Rio de Janeiro, v. 35, n. 29, p. 59-75, jul./dez. 2013.

Pdf disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/cadpsi/v35n29/a04.pdf .

Em nossa micropolítica do cotidiano, é a singularidade que buscamos resgatar ou mesmo construir em cada movimento, em cada ato ou palavra dos analisandos. Talvez, resida aí o ponto nodal e imutável da psicanálise apesar das transformações impostas pelas tecnologias que marcam de forma inexorável a passagem do tempo. (…) A função simbólica do analista, portanto, será suplementada por uma função virtual real, ao mesmo tempo simulacro de presença e consolidação da ausência, com que cada um tem sempre de lidar ao longo da vida. Nesse sentido, as mídias de comunicação, mas como mais uma ferramenta possível e até mesmo necessária e útil num mundo digital consolidado.

Destarte, além do uso desde há algum tempo da conversa à distância entre terapeuta e paciente, inaugurando-se a sessão virtual, por meio de recursos como Skype e Whatsapp, já se tem notícias também de aplicativos especialmente imaginados e desenvolvidos para uso Psi (e não resisto à tentação de os chamar de apsicativos, perdoem-me).

Dentre outros, é o caso, por exemplo, do Fotossenti, um APP assim apresentado, em 2015, por seus criadores: “… um inovador sistema de informação para auxiliar em tratamentos psicológicos por meio de fotos feitas pela câmera de smartphones ou tablets, em que se cria um novo canal de comunicação entre paciente e terapeuta por meio do aplicativo (…) e coloca aplicativo Fotossenti como um instrumento para contribuir na geração de informações para o tratamento psicológico e consequentemente nas decisões tomadas pelo terapeuta aumentando o benefício do tratamento.”8

[8] CARVALHO, D., ARAÚJO, S. Fotossenti: an app to support psychological treatments. Proceedings of the XI Brazilian Symposium on Information Systems. 2015. P. 509-516.

Pdf disponível em: https://aisel.aisnet.org/cgi/viewcontent.cgi?article=1067&context=sbis2015

Estão disponíveis plataformas, sites e APP para diferentes necessidades e/ou intervenções, como, dentre outros – conforme seus anunciantes e independente da discussão de mérito e/ou validade:

  • Calm: APP para pacientes que precisam atingir mindfulness.
  • Cíngulo: para resolver as questões emocionais que mais atrapalham e se aprimorar pelo autoconhecimento.
  • Cogni: APP para pacientes que precisam registrar suas emoções.
  • Cognitus DBT Self-Help: APP para psicólogos que desejam aprender mais sobre Psicoterapia Dialética Comportamental.
  • DSM Reference: APP para psicólogos que precisam consultar regularmente o DSM.
  • FalaFreud: Terapia e Psicólogos online.
  • MindShift: APP para pacientes jovens e adolescentes com problemas de ansiedade.
  • ODK Collect: APP para psicólogos que precisam de ajuda na confecção de questionários de diagnóstico e acompanhamento.
  • OrienteMe: Terapia online. O psicólogo na palma da sua mão. Fale sempre que quiser por mensagens com seu psicólogo pelo APP ou site. Agora você também pode agendar videochamadas.
  • Pacifica: APP para pacientes com problemas de ansiedade.
  • Phobious: APP com objetivo de tratamento para fobias, embora possa ser usado para outros tipos de transtornos, como o obsessivo-compulsivo. Baseado na terapia de dessensibilização sistemática através da exposição gradual virtual.
  • Self-Help Anxiety Management: APP para pacientes com problemas de ansiedade.
  • Talkspace: APP com proposta de conectar pessoas que buscam atendimento terapêutico com profissionais renomados da psicanálise. Lançado nos Estados Unidos em 2014, causou grande polêmica.
  • Zenklub: psicólogos online para cuidar da sua saúde emocional. Agende sessão de terapia online. Psicólogos, Terapeutas, Psicanalistas e Coaches disponíveis.

Como dito antes, vivemos tempos de outras novas formas de subjetivação. Toda vasta gama de alterações na dinâmica dialética do capital-trabalho; o aprisionamento dos seres numa urbanização que desfavorece o indivíduo e sua sociabilidade, em função do ganho de espaços e leitos carroçáveis; a expulsão do senso religioso, sem nada que o substitua; o imperativo do gozo, a imposição do ser feliz, a obrigação do sucesso e seus respectivos simulacros veiculados nas redes sociais; a era dos selfies; a perda da densidade interior em benefício da superficialidade das reflexões e discussões, mesmo e inclusive no meio acadêmico; o ato-desejo de ter como uma panacéia para suprir a rarefação crescente do ser; daí o consumismo como prática, rotina e hábito, qual novas, porém deformadas, ética & estética, e a consequente e comemorada retroalimentação positiva do capitalismo e suas teias de produção; a individualidade (uma propriedade do indivíduo) metamorfoseando-se em individualismo (a valorização máxima dos interesses individuais em detrimento do outro e de todos); a desalterização radical das práticas sociais; todas as formas de intervenções e culto ao corpo como tentativa desesperada de dar concretude e visibilidade a um corpo que precisa se coisificar para atestar que nele habita um eu a quem deve dar guarida, etc.  etc., acabaram por produzir um sujeito caótico (mais ainda), imediatista, supérfluo em si, acelerado, vaidoso, “tecnófilo”, infantil e lúdico no sentido de seu encantamento com os recursos de imagem, som e velocidade das TIC e seus aplicativos. Se isso será definitivamente ruim ou bom, não o sabemos. Quanto muito temos alguns parcos recursos de diagnóstico; tentar um prognóstico seria exercício de adivinhação e futurologia. Deixemos o futuro para as gerações do futuro…

No entanto, dentro do escopo do diagnóstico, insistamos em que a percepção de corpo, de eu, do si, está bastante alterada pela velocidade do aporte e consumo de informações que brilham em nossas telas (televisão, cinema, computadores, notebooks, ebooks, tablets, celulares…), em todos os ambientes que frequentamos e no comum do dia a dia, e que essa enxurrada de fatos-dados e sua velocidade estonteante condicionam agora de outra forma os hábitos cognitivos dos sujeitos, comprometendo-os com as práticas no/do mundo online. Fenômenos como ubiquidade, simultaneidade, instantaneidade, obsolescência, descarte/substituição/reposição, sucesso/fama, o delivery, os APP, fazem parte da estruturação desse novo e fluido sujeito (pós-moderno?).

Nesse imbróglio, a escola bem que poderia ser ainda um locus capaz de conduzir a pedagogia e a didática de harmonização dos tempos e valores extremados pelas marcas intrínsecas das separadas gerações, encarando, enfrentando, absorvendo e elaborando no seu processo as diferenças geracionais. Contudo, ela e seu aparato não se transformam com a mesma velocidade. Assim, costuma surgir um profundo abismo geracional entre professores e alunos, não só por conta da carência material e tecnológica das escolas públicas (e mesmo particulares), mas também pela falta de formação/aperfeiçoamento permanente de nosso pessoal docente, bem como a insuficiência filosófica e estratégica das instituições para administrar o choque.

O certo é que ainda não digerimos, ou melhor – não elaboramos, no jargão da psicologia, essas novidades de comunicação e divulgação e realização. Somente algumas vanguardas o fizeram, mas elas também se mostram receosas e, às vezes, inseguras diante da iniciativa. Estamos todos aqui perplexos frente a nossos novos brinquedos. Em praticamente tudo na vida – e nesse assunto idem – se instala uma distribuição normal, no sentido de norma, gaussiano: há aqueles que rapidamente aderem ao uso do brinquedo novo e estão numa das pontas residuais da curva e há os que de fato resistem a qualquer mudança, e habitam o resíduo oposto da mesma curva. No meio, a imensa população ou faixa compreendida pelo entorno de mais-ou-menos dois desvios-padrões em relação à média e que caminha pisando em ovos, ora achando que sim ora que não deve aderir aos APP e seus parentes e, enquanto isso, debate o tema na esperança de conhecê-lo e domesticá-lo.9

[9] Exemplo de debate: É possível levar a efeito uma análise via internet?, realizado no CEP (Centro de Estudos Psicanalíticos), em 19/2/2016, com Alicia B.D. de Lisondo, Denise S. Goldfajn e Karin de Paula.

Eis a essência dos afetos que nos causam os inexoráveis avanços das tecnologias em sua velocidade cada vez mais indigerível.

Todavia, é inegável que os jovens, estejam eles vinculados à atividade que for, saem-se muito bem com os avanços e suas novidades nesse campo, e só por si já crescem harmonizados com o novo ambiente representado por tais instrumentos/sistemas e consequentes linguagens e discursos. Por isso mesmo, passa a ser obrigação ética dos chamados adultos propiciarem-lhes as condições para o acesso-exercício pleno e lúdico aos antes mencionados novos brinquedos. Ainda que tais adultos não entendam do mérito das questões, sempre terão a maturidade para administrar a demanda-dever e organizar equipes multiprofissionais competentes para o mister. Afinal, não é essa a missão moral e/ou religiosa daqueles que se encontram momentaneamente na liderança?