Quantas pernas tem o grou?

Fausto Antônio de Azevedo

A partir de 1343, a vasta área denominada Eurásia passou a padecer de uma pandemia, uma peste: peste bubônica, peste ou morte negra (na sua evolução causava hemorragias subcutâneas, que se tornavam escuras no momento terminal da doença, de onde resulta o nome). A bactéria Yersinia pestis (bacilo isolado apenas em 1894 pelo francês Alexandre Yersin) causa a doença, e tal agente é transmitido ao homem por pulgas (Xenopsylla cheopis) de ratos-pretos (Rattus rattus) ou de outros roedores. A penetração da bactéria na pele provocava adenite aguda, que era denominada de “bubão”, principal sintoma da doença, e disso vem a designação de peste bubônica. A morte sobrevinha entre três e sete dias após o contágio, acometendo de 75 a 100% dos contaminados.

As estatísticas finais e globais apontaram para algo em torno de 25 milhões de mortes (ainda há muitos desencontros quanto aos números). Na Europa, onde o pico da peste, originária do Oriente, ocorreu no período 1346-1353 (século XIV portanto), acredita-se que um-terço da população morreu. A Itália foi onde a peste se manifestou com maior violência, gerando consequências que se propagaram por séculos sucessivos, a ponto de alguns historiadores sugerirem 1348 como o ano simbólico do fim da Idade Média1.

O contingente populacional da região afetada retornou aos níveis pré-peste somente após o século XVII. A peste negra manifestou-se pela Europa de forma intermitente e endêmica, em pequena escala, até desaparecer do continente pelo início do século XIX.

Segundo Karini Simoni, “As casas dos acometidos eram trancadas. Muitos tentavam parar o avanço da morte queimando louro, pinus, folhas de limoeiro e outras, para vencer o odor dos cadáveres deixados ao longo das estradas. Alguns se propunham a queimar os pertences dos mortos, e talvez fosse essa a única medida verdadeiramente eficaz para combater a difusão da peste. Claramente, para os vivos, o isolamento era a melhor arma. Os mais abastados deixavam as cidades e se dirigiam para o campo para evitar o contágio.”2 (Grifo meu.)

A dura realidade da peste alterou o comportamento social, mudando o modo de pensar das pessoas: consolida-se a “cultura da morte”, percebida no sentimento da igualdade de todos diante da morte, na reprodução artística de corpos em estado de putrefação, na propagação de imagens de mártires, nas penitências, como o grande e repetitivo número de missas, indicativos da angústia vivida. O medo, o sofrimento e a dramaticidade emergiram também nas narrativas dos cronistas da época3.

Assim, tal flagelo constituiu o contexto para uma das grandes obras da literatura italiana (e universal). Trata-se do “Decameron” (ou Decamerão), de Boccaccio, considerada pelos especialistas um dos mais representativos exemplos do embate e da síntese de valores morais e sociais ocorridos no “outono” da Idade Média, quando os últimos sopros das idéias teocráticas e feudalistas (a moral medieval e seu amor espiritual) foram superados pelo Humanismo (com seu realismo que começa e o fortalecimento dos valores terrenos), e pelo crescimento da burguesia mercantilista. No “Decameron”, já não é mais o divino que comanda a conduta do homem, mas a natureza. Ademais, como técnica literária, o autor faz grande e inteligente uso da ironia, e se o leitor não atentar para esse estratagema talvez não tenha uma clara intenção dos propósitos de Boccaccio.

Giovanni Boccaccio, florentino (Florença ou Certaldo, 16/junho/1313 – Certaldo, 21/dezembro/1375), poeta e estudioso literário, foi um importante humanista, autor de muitas e qualificadas obras. É considerado a terceira das três coroas da literatura italiana, ao lado de Dante e Petrarca. O “Decameron” o tornou o primeiro grande realista da literatura universal. Especializado em Dante Alighieri, ao ler “A Comédia”, ficou tão impressionado que a rebatizou de “A Divina Comédia”, título que a imortalizou.

O “Decameron” (do grego antigo: “deca” = dez, mais “hemeron” = dias, jornadas)4 é uma coleção de cem novelas escritas entre1348 e 1353, quando no auge da peste negra em Florença. Sete moças e três rapazes, abrigados numa vila isolada de Florença, numa espécie de refúgio no campo (fuga simbólica da sociedade), para escapar à pandemia da peste, relatam histórias (10 ao dia, mas em 15 dias, porque há intervalos para descanso e orações), que transitam do erótico ao trágico; contos de sagacidade, piadas e lições de vida, fornecendo uma notável caracterização crítica da vida na época e seus costumes. Há narrativas ali cuja origem parece remota, de lugares como Pérsia, Índia, etc.: o quinto da segunda jornada, que fala de Andreuccio, vai aos contos efésios, de Xenofonte de Éfeso. Mesmo a descrição da peste negra não é original e parece apoiar-se na “História gentis Langobardorum”, de Paulo, o Diácono, que viveu no oitavo século.

As circunstâncias retratadas trazem a percepção medieval da numerologia e significados místicos. Crê-se que as sete moças representam as Quatro Virtudes Cardinais (Prudência, Justiça, Fortaleza, Temperança) e as Três Virtudes Teologais (Fé, Esperança e Caridade), há também qualquer alusão aos “7 pecados capitais”5, e os três homens representam a Divisão da Alma em Três Partes (Razão, Ira e Luxúria) da tradição helênica. As moças tinham idades entre 18 e 28 anos, eram bonitas e de origem nobre, e seu comportamento honesto. Reunidas por acaso na igreja de Santa Maria Novela, resolvem continuar juntas e logo surgem três moços, com idade a partir dos 25 anos, bem-educados, que procuravam suas amadas, que eram três das moças ali reunidas.

Bem no início do longo texto do “Decameron” Boccaccio se refere à peste, que talvez haja dizimado um quinto dos habitantes de Florença, dentre eles vários parentes e amigos seus, inclusive seu pai. Diz ele, na moldura, na preparação explicativa ao relato da Primeira Novela e da própria obra:

“Maior era o espetáculo da miséria da gente miúda e, talvez, em grande parte da mediana; pois essas pessoas, retidas em casa pela esperança ou pela pobreza, permanecendo na vizinhança, adoeciam aos milhares; e, não sendo servidas nem ajudadas por coisa alguma, morriam todas quase sem nenhuma redenção. Várias expiravam na via pública, de dia ou de noite; muitas outras, que expiravam em casa, os vizinhos percebiam que estavam mortas mais pelo fedor do corpo em decomposição do que por outros meios; e tudo se enchia destes e de outros que morriam por toda parte. Os vizinhos, em geral, movidos tanto pelo temor de que a decomposição dos corpos os afetasse quanto pela caridade que tinham pelos falecidos, observavam um mesmo costume. Sozinhos ou com a ajuda de carregadores, quando podiam contar com estes, tiravam os finados de suas respectivas casas e os punham diante da porta, onde, sobretudo pelas manhãs, um sem-número deles podia ser visto por quem quer que passasse; então, providenciavam ataúdes e os carregavam (alguns corpos, por falta de ataúdes, foram carregados sobre tábuas). Um mesmo ataúde podia carregar dois ou três mortos juntos, e isso não ocorreu só uma vez, mas seria possível enumerar vários que continham marido e mulher, dois ou três irmãos, pai e filho, e assim por diante. […] Não sendo bastante o solo sagrado para sepultar a grande quantidade de corpos que chegavam carregados às igrejas a cada dia e quase a cada hora […], abriam-se nos cemitérios das igrejas, depois que todos os lugares ficassem ocupados, enormes valas nas quais os corpos que chegavam eram postos às centenas: eram eles empilhados em camadas, tal como a mercadoria na estiva dos navios, e cada camada era coberta com pouca terra até que a vala se enchesse até a borda.”

“[…] foi tamanha a crueldade do céu, e talvez em parte dos homens, que se tem por certo que do mês de março a julho […] mais de cem mil criaturas humanas perderam a vida dentro dos muros da cidade de Florença, e que talvez, antes dessa mortandade, não se imaginasse que lá haveria tanta gente assim? Oh, quantos grandes palácios, quantas belas casas, quantas nobres moradas, antes cheios de criados, senhores e senhoras, esvaziaram-se de todos, até o mais ínfimo serviçal! Oh, quantas memoráveis linhagens, quantas grandes heranças, quantas famosas riquezas ficaram sem seus devidos sucessores! Quantos homens valorosos, quantas belas mulheres, quantos jovens airosos […] pela manhã comeram com familiares, companheiros e amigos, e à noite cearam no outro mundo com seus antepassados!” (Grifo meu.)

Para Boccaccio, a peste ecoa também fortemente no tecido social da época, esgarçando-o e rompendo-o, dissolvendo qualquer ordem social e civil, nocauteando os limites morais e a autoridade das leis sejam humanas sejam divinas. Ele vê a catástrofe como um momento de transgressão e destruição das normas e dos valores sobre os quais se dava a convivência social de até então, posto que todos os estatutos e institutos vigentes não dão mais conta de explicar nem conter o processo mórbido, que progride com toda indiferença e crueldade, não distinguindo ricos de pobres, crianças de idosos, homens de mulheres, santos de pecadores…, desintegrando as famílias e anulando assim todas as crenças, valores e formas da lógica e do conhecimento praticadas. Mas um outro viés corre em paralelo a tudo isso: uma tal desorganização daquele mundo aproxima os jovens protagonistas da história e os prepara e conduz à solidariedade. Portanto, o relato da peste não teria um fim em si mesmo, pelo contrário, completa a reflexão sobre um novo projeto de vida capaz de superar o problema: contra aquele quadro de destruição e morte, os protagonistas invocam uma existência dialeticamente fundada sobre o “princípio do prazer”6. Logo, um Eros nascente, na forma da juventude e da pulsão de vida, sobrevive a Tânatos e ao fim daqueles tempos e sociedades para inaugurar um novo e potencial momento, muito fundado no natural do ser humano, em seu corpo, carnalidade e eroticidade.

Decameron, 1492

Sem dúvida, foram os dias árduos que estamos atravessando com a evolução da pandemia pelo Coronavírus, que me remeteram na memória à obra de Boccaccio. Tinha 20 anos de idade quando a Editora Abril publicava e distribuía, nas bancas de jornais de São Paulo, sua magnífica coleção, em belas capas vermelhas: “Os Imortais da Literatura Universal”. O tomo 5 foi o “Decamerão”. Com bastante interesse eu aguardava cada lançamento. O do Boccaccio foi uma leitura difícil – além das 582 páginas de letras miúdas, o estilo não me era familiar, tampouco o contexto. Mas uma atmosfera provocante cercava o título… Então, fui adiante e acabei fixando alguma recordação. Na mesma época vimos o filme do polêmico Pasolini7 e continuei a seguir em frente… Agora revisitei o livro, não re-lendo (ainda) as 100 novelas, mas salteando por algumas delas. Foi quando me deparei com essa gostosa narrativa de Neifile, a respeito das venturas e desventuras do Chichibio…

A Sexta Jornada “se dá sob o reinado de Elisa, na qual se discorre de quem, tentando com alguma frase elegante, consegue salvar se por meio de resposta rápida, ou mesmo de esperteza, fugindo da perda, de perigo, ou de zombaria.”8 E diz a novela de número quatro.

QUARTA NOVELA

Chichibio, cozinheiro de Corrado Gianfigliazzi, salva-se com uma frase oportuna, transformando a ira de Corrado em riso e escapando da desventura com que Corrado o ameaçara.

Lauretta já se calava, todos elogiavam muito Nonna, quando a rainha ordenou a Neifile que continuasse; e ela disse:

– Amorosas senhoras, embora o pronto engenho inspire amiúde aos eloquentes palavras rápidas, úteis e belas, de acordo com as circunstâncias, também a Fortuna, ajudando às vezes os medrosos, põe inopinadamente em sua língua palavras que nem mesmo o eloquente teria encontrado com mente tranquila: é isso o que a minha história pretende demonstrar.

Corrado Gianfigliazzi, como todas devem ter ouvido dizer ou conhecido de vista, sempre foi um cidadão notável de Florença, liberal e magnificente, que levava vida cavaleiresca e sempre apreciou muito cães e aves de cetraria, sem falar de suas ações de maior importância. Caçando com seu falcão um dia, perto de Peretola, matou um grou e, vendo que ele era gordo e novo, mandou-o a seu bom cozinheiro, que se chamava Chichibio e era veneziano, dizendo que o assasse e preparasse muito bem para o jantar. Chichibio, que parecia, e de fato era, um tremendo falastrão, preparou o grou, colocou-o no fogo e começou a cozinhá-lo com esmero. Quando o grou já estava quase cozido e exalava forte aroma, entrou na cozinha uma mulherzinha do campo, chamada Brunetta, por quem Chichibio estava muito apaixonado; sentindo o aroma do grou e vendo-o, ela pediu manhosamente a Chichibio que lhe desse uma coxa.

Grou coroado

Chichibio respondeu cantando:

– De mi não a terá, dona Brunetta, de mi não a terá.

Dona Brunetta ficou muito irritada e disse:

– Juro por Deus, se você não der, nunca mais vai ter de mim nada que quiser.

Em suma, foram tantas as palavras que, no fim, Chichibio, para não irritar a sua senhora, arrancou uma das coxas do grou e lhe deu.

Quando o grou foi posto sem a coxa diante de Corrado e de algum hóspede seu, todos se admiraram; Corrado mandou chamar Chichibio e lhe perguntou o que havia acontecido com a outra coxa do grou. Então o veneziano mentiroso respondeu depressa:

– Senhor, os grous só têm uma coxa e uma pata.

Corrado, irritado, disse:

– Que diabo, como só têm uma coxa e uma pata? Será que este foi o único grou que eu vi na vida?

Chichibio prosseguiu:

– É o que eu estou dizendo; e, quando o senhor quiser, posso provar esse fato nos grous vivos.

Corrado, em respeito aos hóspedes que estavam lá, não quis continuar a discussão, mas disse:

– Já que você diz que vai provar esse fato nos vivos, coisa que eu nunca vi nem ouvi dizer que existe, quero ver amanhã de manhã, e então vou me dar por satisfeito; mas juro pelo corpo de Cristo que, se não for assim, vou mandar lhe dar tamanha surra, que você nunca mais vai se esquecer do meu nome enquanto viver.

Foi encerrada por aquela noite a discussão. Na manhã seguinte, assim que o dia surgiu, Corrado, cuja ira não desaparecera com o sono, acordou furioso e ordenou que lhe trouxessem os cavalos; mandando Chichibio montar num rocim, conduziu-o a um rio em cujas margens era possível ver muitos grous sempre ao amanhecer e disse:

– Logo vamos ver quem mentiu ontem, você ou eu.

Chichibio, vendo que a raiva de Corrado não se dissipara, e que precisava provar a mentira que dissera, sem saber como fazê-lo, cavalgava ao lado de Corrado com o maior medo do mundo, e, se pudesse, teria fugido, mas, não podendo, observava ora à sua frente, ora atrás, ora dos lados, e acreditava que tudo o que via eram grous sobre duas patas.

Mas, quando chegaram bem perto do rio, a primeira coisa que viram foi uma dúzia de grous, todos sobre uma única pata, tal como costumam fazer quando dormem; por isso ele logo os mostrou a Corrado, dizendo:

– Se o senhor olhar aqueles grous que estão lá, vai ver que ontem à noite eu disse a verdade, que os grous têm só uma coxa e uma pata.

Vendo-os, Corrado disse:

– Espere um pouco, que eu vou mostrar que eles têm duas.

E, aproximando-se um pouco deles, gritou: “ho, ho!”, e com esse grito os grous abaixaram a outra pata e, depois de darem alguns passos, levantaram voo; então Corrado voltou-se para Chichibio e disse:

– O que acha, espertalhão? Não acha que eles têm duas?

Chichibio, como se estivesse espantado, não sabendo nem ele mesmo de onde lhe veio a resposta, disse:

– Sim, senhor, mas o senhor não gritou “ho, ho!” para aquele de ontem à noite; porque, se tivesse gritado, ele teria posto a outra coxa e a outra pata para fora, como esses daí puseram.

Corrado gostou tanto da resposta, que toda a sua raiva se transformou em bom humor e risada; então disse:

– Chichibio, tem razão, eu deveria ter feito isso.

Assim, pois, com sua resposta pronta e divertida, Chichibio evitou a desventura e ficou em paz com seu patrão.

Giovanni Boccaccio. Decameron.
[Tradução: Ivone C. Benedetti. Introdução: Carlos Berriel.]
Porto Alegre: L&PM Editores, 2013. 632 p.
https://www.lpm-editores.com.br/site/default.asp?Template=../livros/layout_produto.asp&CategoriaID=636453&ID=745284
Disponível em: http://lelivros.love/book/download-decameron-giovanni-boccaccio-em-epub-mobi-e-pdf/

Decameron: os jovens narrando e ouvindo suas histórias

Fica nítido que, frente à aguda realidade da “morte negra”, Boccaccio se esforçou por escrever e nos mostrar, pelo artifício do riso ou da ironia, a possibilidade de uma tentativa de superar e vencer tal realidade. Percebemos na narrativa de Neifile sinais claros da atuação do desejo, do medo, da reinterpretação da realidade (segundo conveniências), da manipulação, da condescendência, do inusitado, do gracejo, do humor, da acomodação de partes opostas, da alimentação… Nessa novela, dois mundos, duas realidades muito distintas convivem: a nobreza e o mundo popular. Nota-se com Corrado, na nobreza, um tipo de cortesia, de refinamento, ao passo que no plano popular os fatos são mais crus e outros (bem mais reais, bem mais humanos…), a exemplo da cena de amor na cozinha… Outro ponto nem tão sutilmente assinalado é ser Chichibio veneziano (aliás, o nome é bastante veneziano) e caracterizado como frívolo, interesseiro, o que pode ser atribuído à rivalidade entre Veneza e Florença, por motivos políticos e comerciais. Todavia, o que mais salta aos olhos do leitor atento é a inteligência lépida de Chichibio ao distorcer os fatos e improvisar tempestivamente um arremate à fala áspera de Corrado, ao modo de uma glosa ou de um sagaz repentista do nordeste brasileiro…

Chichibio se sai bem. Seu tempo é aquele em que os excluídos da nobreza começam a ter algumas perspectivas, começam, aos poucos, a prosperar e vai-se, aos poucos também, formar a burguesia. Com ela, novos valores virão, já acolhidos pelo humanismo, uma mudança na participação da Igreja no dia a dia cotidiano, que doravante terá que partilhar seu domínio com a ascensão da cartilha do Iluminismo que chegará em breve. Chichibio talvez seja o protótipo precoce desse “homem do futuro”, que, por certo, veio depois: amante, bom cozinheiro (hoje, ele seria um “chef” e teria programa na televisão), esperto, sagaz, centrado em seus prazeres e interesses, falastrão, cem por cento aderido à sua realidade mundana, nela navegando com desenvoltura e poder.

Bem-vindos Chichibios, espantosamente o século XXI pertence a vocês: nunca o passado distante esteve tão vivo no presente quanto pelas mãos de Boccaccio e pela causticidade das pestes!

Notas e Referências

[1] Ovidio Capitani. Morire di peste: testimonianze antiche e interpretazioni moderne della peste nera dei 1348. Ed. Patron: Bologna, 1995. In: Karine Simoni. De peste e literatura: imagens do Decameron de Giovanni Boccaccio. Anuário de Literatura, Florianópolis, 2007. p. 31-40. Disponível em:

https://periodicos.ufsc.br/index.php/literatura/article/viewFile/5447/4882

[2] Karine Simoni. De peste e literatura: imagens do Decameron de Giovanni Boccaccio. Anuário de Literatura, Florianópolis, 2007. p. 31-40. Disponível em:

https://periodicos.ufsc.br/index.php/literatura/article/viewFile/5447/4882

[3] Idem.

[4] “Hexameron” (do grego hexa = seis, mais hemer = dia) aplica-se a um gênero literário teológico relativo à obra de Deus (os “seis dias da criação) e também aos próprios seis dias. Santo Ambrósio (“Hexameron”) e Santo Agostinho (“De Genesi ad litteram”) escreveram as mais antigas obras hexamerais ainda existentes. Santo Tomás de Aquino e São João Boaventura, entre outros, também escreveram textos hexamerais. Com o nome “Decameron”, Boccaccio como que brinca com a “criação do mundo” em seis dias, mostrando que agora, com o impacto altamente destrutivo da peste, somado a e acelerando a mudança dos tempos, uma nova sociedade se vai criando, o mundo se vai “recriando”, dessa vez em dez dias…

[5] O Papa Gregório I (fins do século VI) relacionou em ordem decrescente os pecados mais ofensivos ao amor: Orgulho, Inveja, Ira, Indolência, Avareza, Gula, Luxúria.

[6] Karine Simoni. De peste e literatura: imagens do Decameron de Giovanni Boccaccio. Anuário de Literatura, Florianópolis, 2007. p. 31-40. Disponível em:

https://periodicos.ufsc.br/index.php/literatura/article/viewFile/5447/4882

[7] “Il Decameron” (1971), do diretor Paolo Pasolini. https://www.imdb.com/title/tt0065622/?ref_=fn_tt_tt_1

Para aprofundamento sobre o filme ver:

Paula Regina Siega. Il Decameron de Pier Paolo Pasolini: da prosa medieval ao roteiro cinematográfico. ALEA (Rio de Janeiro), vol. 14/2: 201-216, jul-dez 2012.

[8] Giovanni Boccaccio. Decamerão. [Tradução: Torrieri Guimarães.] São Paulo: Editora Abril Cultural, 1970. p. 321.