Insônia e a clínica contemporânea

Por que não dormimos? Se o sono é uma necessidade biológica, restaura nossa vida psíquica; se estamos lutando internamente para que o sono chegue, por que não conseguimos nos desligar? Qual é a verdade que está por trás de toda esta agitação? 

A neurociência nos oferece saídas químicas para um desligamento forçado da realidade objetiva. Mas não consegue dar respostas sobre as causas de não conseguirmos adormecer.

A insônia pode ser  sinal de um quadro depressivo, ou de ansiedade.

Vale problematizar  dois aspectos referentes a esta questão.

 Primeiro que a insônia é um sintoma da contemporaneidade. O homem pós-moderno não pode parar. Este é um dos mandados da nossa cultura do consumo cujo lema é “produza todo o tempo para poder comprar cada vez mais”. Internalizamos que valemos porque produzimos. Assim, o registro psíquico se estabelece como ‘ dormir é perda de tempo’. Em relação a isso, precisamos nos questionar sobre o valor do ócio, do lazer, de simplesmente  poder escolher fazer algo ou não. O filósofo Byung-Chul Han nos fala sobre a violência do excesso de positividade de uma sociedade como a nossa: normopatia, abundância de consenso, superdesempenho,  o imperativo do ‘você quer, você pode’. Ele nos lembra que “a depressão é o adoecimento de uma sociedade que sofre sob o excesso de positividade”. Como conseguir dormir tranqüilo com toda essa pressão social? Ou, como diz o provérbio português: “ e durma-se com um barulho desses…”.

O segundo ponto  que gostaria de abordar  é que durante o sono, ocorre um afroxamento da    censura e acabamos entrando em contato com  parte do  material psíquico que rejeitamos por algum motivo. Em outras palavras, sonhamos. E os sonhos nos colocam em contato com nossos demônios mais temidos: aquilo que desejamos, mas que socialmente é desaprovado. Este é um conflito que, muitas vezes, não nos permite dormir.

Uma saída possível é de entrarmos em contato com nossos medos, com os monstros que habitam as profundezas do nosso inconsciente para nos darmos conta de que, talvez, eles não sejam tão terríveis assim. É investir  no sentido de que se durma porque se deseja dormir e não porque seja apenas necessário. Incluir o desejo, o prazer, se permitir ‘não fazer’, se autorizar  descansar, podem ser um começo para o tratamento da insônia.